Bem,o assunto é complicado. Primeiramente gostaria de deixar registrada minha experiência, não muito diferente da maioria dos brasileiros afrodescendentes, somos vítimas do racismo velado vigente em nossa sociedade hipócrita. Fato corriqueiro no dia a dia, o racismo aparece constantemente à nossa frente, no nosso trabalho, entre nossos amigos. Entre amigos? É! E por que não? Certo dia encontro uma ex-colega de trabalho que não via faz algum tempo, interessante foi que como amigos que não se veem ha tempo, surge a alegria do reencontro, e conversa vai... quando ela me inquiriu a respeito de um óculos de sol que eu usava, abordagem foi conotativamente racista:"-você com esse óculos fica bem, parecendo um macaco.(risos)" Ela talvez não tenha percebido o tom racista, e para manter a política da urbanidade, nós afrodescendetes temos que aceitar isso como normal. Caso entre na questão racial do comentário, o assunto sempre é tido como brincadeira, ou algo sem importância, complexo nosso. Caso tivesse sido uma pessoa indouta, sem informação, ignorante de pai e mãe, não levaria à serio. No entanto, essa pessoa é uma funcionário do Poder Judiciário, parente de desembargador. Aí eu pensei: se o Supremo Tribunal Federal vai julgar se é constitucional as cotas para negros nas universidades, assim como as políticas de ações afirmativas que visam diminuir a desigualdade construída em quinhentos anos de história do Brasil, como será esse julgamento, feito por pessoas que são brancas, nascidas em berço de ouro (esse aureo berço fruto do trabalho dos nossos antepassados). Será que essas pessoas podem compreender, ou tem consciência da prática racista cotidiana deles? O que ocorre é que nós negros sempres fomos julgados e condenados por nossos inimigos, e sempre se fazendo de amigos nos usurpam o direito à dignidade da pessoa humana, se essa pessoa que tem influência dentro do poder judiciário vai julgar uma ação de racismo como ela se portará? será que ficará do lado do direito (justiça), ou do lado que sempre esteve - do lado dos dominadores, opressores que sempre veem os negros comos inferiores, motivos de chacota. Para eles é normal que o negro esteja como seviçal, mendingo, pobre, marginalizado. A reflexão nos conduz a uma importante experiência; o negro no Brasil é para construir a riqueza dessa nação, construir as mansões que nunca terão dinheiro para comprar, apanhar da polícia e ficar quieto se conseguir uma ascensão social. Se o negro passa a integrar a classe média é um emergente, e como todo emergente "deve se achar quase branco" e não se importar com a questão racial. Alguns argumentam que o problema é a pobreza, mas caso um negro esteja em local elitizado por conseguir através de seus esforços uma posição de destaque, ele será estigmatizado e obrigado a suportar as "bricadeirinhas" racistas comumente aceitas em nossa hipócrita sociedade brasileira. Por que não investigar a história e descobrir como foi criada essa mentalidade? Não, jamais, isso é assunto que não se deve comentar se você quiser ser aceito em seu novo meio social, qual o padrão de beleza não tem nada haver com você, a vida que se leva não é pra você, o lugar não é pra vc e etc. Certa feita num aeroporto aguardando o embarque, por diversas vezes foi-me perguntado se eu era jogador de futebol, afinal de contas um jovem negro com dinheiro pra viajar de avião só pode ser jogador de futebol. É o pensamento comum na mente dos brasileiros, infelizmente essa é nossa realidade contidiana, só sabe quem é negro, não adianta ter dinheiro, carro, casa boa, porque a sua cor vai denunciar de onde você veio -senzala- e isso para eles (racistas)é imutável. Sinceramente, a única coisa que os brancos burgueses tem de bom é o dinheiro, porque não tem cultura, não tem educação, não tem senso de respeito para com os seres humanos, e sempre procuram se unir contra nós, para eles devemos sempre ficar em posição de subordinação, e caso não tenhamos uma serventia pra eles, é normal que a policia nos mate, ou as drogas, ou o desemprego, ou o alcool, ou o racismo continuo que se arrasta por quinhentos anos de história nesse país colonizado pelo expurgo português. Ainda sobre as cotas na universidade, não somos inferiores intelectualmente, o problema tá na cara:enquanto o boy tem comida, material escolar, livros, inglês, natação, video game, etc. o negro pobre tem que trabalhar pra comprar um caderno para estudar à noite quando chega de um jornada de trabalho de nove a doze horas diarias, em condições de trabalho quase escrava, por um misero dinheiro, com a esperança de competir com o boy que é preparado para a universidade desde a pré-escola quando lhe é perguntado sobre o que quer ser quando crescer, e só vai trabalhar depois de formado na graduação, ou ainda pós graduado, com vinte e poucos anos. "Dois pesos e duas medidas é abominação" diz a bíblia, contudo eles que se dizem cristãos querem promover uma competição desigual, é semelhante a apostar uma corrida entre um fusca e uma ferrari, na qual o motorista da ferrari ainda se acha merecedor do mérito da vitória. Se meu filho é preparado para o vestibular desde o primário e ainda comemora porque foi aprovado, ele não fez mais do que o esperado, ou a lagarta vai comemorar porque virou borboleta, se já estava programado naturalmente o acontecimento. Brasileiros e brasileiras deixemos de ser hipócritas, de querer imaginar um país europeu aqui. Quem tiver incomodado e com dupla nacionalidade que vá embora e não volte nunca mais, quer ver loiro vá morar na Alemanha, porque no Brasil a maioria da população é de origem afro-indigena e indigentes portugueses que foram mandados para o Brasil como pena alternativa por crimes para não irem pra cadeia em Portugal. Rebanho de filhos da pátria é melhor se acostumarem porque o poder terá que ser dividido com a maioria - Este não é o princípio da democracia? Então que possamos construir uma nova sociedade cunhada na igualdade, diferentes sim, mas não desiguais.
"Racistas ótarios nos deixem em paz"(Racionais MC's).
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